terça-feira, 20 de outubro de 2009

Uma ida à biblioteca Lúcio Mendonça

Eu, estudante de Ciências Sociais, formanda, fazendo uma monografia sobre o pensamento social de Mário de Andrade e Roquette-Pinto acerca do folclore. Ando visitando inúmeras bibliotecas do Rio de Janeiro a procura de material para minha pesquisa.

Hoje foi o dia de eu conhecer a Biblioteca Acadêmica Lúcio Mendonça, da Academia Brasileira de Letras.

Horário? Depois do almoço! Fui andando do restaurante até a ABL, cheguei lá, portões fechados, como eu sei que tem dois prédios, fui até o segundo, o mais moderno, chego lá e procuro me informar, o segurança logo me fala “essa biblioteca é no outro prédio!”, mas como se eu passei por lá e estava tudo fechado?, “não, é um portão bem pequeninho, pode ir...”, então lá fui eu, passei a mão no portão e ele estava realmente aberto. Lá dentro, no jardim, estavam dois homens, perguntei se era ali a biblioteca e eles me disseram que sim. Um deles, mais tarde descobri seu nome, o Luiz Antônio, que estava lá terminando de dar suas pitadas (espero que a mulher dele não leia isso, ele me confessou que fuma escondido), foi logo me perguntando se eu queria fazer uma pesquisa e qual era o tema. Após os procedimentos normais: dar nome, identidade, deixar a mochila no guarda-volumes), Luiz já no elevador começou a puxa papo comigo, estava me dizendo da hipocrisia das outras bibliotecas de não deixarem os usuários entrarem com pertences, quando na verdade quem rouba os livros não entra pela porta da frente.


Chegamos à biblioteca, um lugar lindo, muitos livros (lógico, Náshara!) espalhados pela mesa, pessoas, todos funcionários, circulando pra lá e pra cá. Disse pra Luiz Antônio os livros e artigos que eu queria, ele foi logo me mostrando que estava trabalhando na organização das revistas que eu estava querendo e me mostrou o estado das revistas. “Sabe por que estão assim, caindo aos pedaços? Por falta de uso!” Achei curiosíssimo o tom de revolta dele, por tais exemplares não serem vistos e usados pelas pessoas.

Luiz me entregou as publicações que eu precisava, e foi logo procurar os livros que eu também iria precisar, mas não se passaram nem cinco minutos e ele me chamou. “Quero lhe mostrar como fazemos para classificar os livros.“ E me ensinou que quando procuramos um livro, após acharmos no cadastro, temos que ver o número de páginas, que facilita na hora da procura nas estantes. Ajudei-o a procurar os livros, fui vendo outros livros interessantes, e a vontade de pegar todos para folhear só crescia.

Enquanto procurávamos o papo ia fluindo, e Luiz ia me contando história de livros, de como pelas dedicatórias dos autores descobrimos relações de parentesco nunca imaginados, me mostrou que tal autor na verdade era primo de um outro. Desculpem a falta de memória dessa que vos escreve, mas foram muitas informações hoje.

Vi o primeiro livro de Ligia (sim é escrito com I e não com Y como teimam por aí) Fagundes Teles, com uma dedicatória e um bilhete dela para Manuel Bandeira, e uma foto que ela enviou junto. Nossa, como num simples bilhete continha tanta poesia. Vi um livro sobre Picasso, também não me recordo o nome do autor, com assinatura do próprio Picasso.

Em um certo momento Luiz disse “vou te mostrar uma coisa que não mostro pra qualquer um”, e me levou pra uma outra sala onde estava a coleção particular de Manuel Bandeira, lá abriu um armário e tirou a primeira edição d’Os Lusiadas de 1572, eu peguei com as minhas próprias mãos, não preciso dizer da emoção que senti! Logo depois ele me mostrou a primeira edição de Grande Sertão Veredas em papel de bíblia, em que só foram tirados 20 exemplares, todas assinadas por Guimarães Rosa. E assim foram surgindo obras e mais obras raras nas minhas mãos.

Quando eu saí daquela mágica sala, estava sentado na mesa em que eu estava pesquisando, nada mais, nada menos que o imortal Sérgio Paulo Rouanet. E Luiz fala “essa mocinha está fazendo uma pesquisa sobre Folclore e eu estava mostrando para ela agora a primeira edição da “Enciclopédia ou Dicionário racional das ciências, das artes e dos ofícios”.” Rouanet fez uma cara de ué e falou “Estou aqui me perguntando o que o Iluminismo tem a ver com o Folclore.” E eu “nada, foi pura curiosidade de ver obras raras.” E daí ele começou a me dar uma aula sobre Romantismo e Folclore, ali, sentado na minha frente. Ainda me perguntou onde eu estudava, o que eu pretendia fazer depois, e ficamos assim, conversando por um tempo. Depois ele se levantou, apertou minha mão e me desejou boa sorte. Não tenho dúvidas de que minha sorte anda muito boa!

Luiz ainda me ajudou um tanto, me mostrou mais várias obras, me deu aula de história, de como tratar um livro e disse: Os autores revivem sempre que lemos um livro deles. Pediu que eu falasse pras pessoas que a biblioteca está acessível para todos e lamentou que poucas pessoas fossem até lá.

Foi uma tarde espetacular, não poderia ser melhor essa minha tarde de terça-feira! A pesquisa? Não consegui muita coisa, mas valeu por todo resto. E amanhã estarei lá novamente!

Um comentário:

  1. Nash, adorei esse post sobre a biblioteca!
    E esses detalhes sobre os recados e dedicatórias presentes em livros antigos são ainda mais interessantes! Beijos e boa sorte na pesquisa!

    ResponderExcluir